sábado, 4 de janeiro de 2014

A maré está virando contra a homofobia


Amigos, costumamos repetir e enfatizar aqui que a Igreja Católica Romana é um corpo social que se situa, como todas as instituições, dentro de um contexto sociocultural mais amplo. É importante entender que a homofobia que existe hoje nesse corpo social que chamamos de Igreja é reflexo da homofobia que ainda reage e resiste no seio da sociedade de maneira mais ampla. Por isso, ao ler o artigo abaixo (outra retrospectiva, mais detalhada, você encontra aqui), achei interessante traduzir para compartilhar com vocês, sobretudo depois de termos publicado, há alguns dias, a notícia de que o núncio apostólico em Uganda havia se manifestado frontalmente contra a aprovação da lei antigay (aqui)

Não podemos esquecer que mentalidades mudam muito lentamente, e ainda assim estamos assistindo a transformações, como assinala o autor, aceleradas nestes últimos anos. Com relação aos LGBTs, assim como existem, dentro e fora da Igreja, as forças homofóbicas que resistem, existem as forças da inclusão, da abertura, do diálogo, que avançam - e é deste lado que nós, aqui no Diversidade Católica, procuramos nos manter. Porque procuramos ser a Igreja que queremos ver no mundo.

Segue o artigo de Ian Birrel, publicado originalmente no The Guardian (aqui).


Em Uganda, duas pessoas que façam sexo podem acabar ser condenadas à prisão perpétua, se por acaso forem do mesmo sexo. Se os amigos ou familiares de um servidor público não denunciarem suas práticas homossexuais, correm o risco de se juntar a eles na prisão. É o que determina uma lei aprovada na semana passada nesse país. A medida - que acaba de ser aprovada pelo presidente - é o ponto culminante de uma campanha de quatro anos. "Esta é uma vitória para Uganda", disse David Bahati, o parlamentar autor do projeto de lei. "O Parlamento votou contra o mal."

Para a maioria dos britânicos, o mal, nesse caso, na verdade é o intolerante Bahati. No mesmo dia, o Senado nigeriano aprovou uma lei anti-gay, criminalizando até os grupos de defesa dos direitos LGBT. Poucos dias antes, a suprema corte indiana rejeitou a descriminalização da homossexualidade e juízes australianos derrubaram o casamento igualitário, enquanto, na Rússia, sanções presidenciais convertem a discriminação em política de Estado, alimentando o clima de medo.

É um final de ano deprimente em um dos principais campos dos direitos humanos em nossos tempos. No entanto, não devemos nos desesperar. Sim, esses exemplos - e já houve outros retrocessos grotescos na luta global pela igualdade gay, para não falar de espancamentos e assassinatos - são preocupantes. Mas estamos em meio a uma revolução mundial, em que a maré está virando contra a homofobia.

Hoje existem 24 deputados abertamente gays em Westminster [o Parlamento britânico] - e, curiosamente, mais nos bancos conservadores do que nos dos outros partidos juntos, o que coloca em perspectiva as recentes tentativas de expulsar Crispin Blunt pelo "desaforo" de ter saído do armário e o ridículo barulho da direita contra o casamento igualitário. Três décadas atrás, essa ideia enfrentava a oposição de dois terços do eleitorado britânico, enquanto nove em cada 10 tinham horror a adoções gays; hoje, apenas uma pessoa em cada cinco desaprova relacionamentos gays, e cerca de metade encara a adoção gay com naturalidade. 

Mudanças semelhantes podem ser observadas em outros lugares do Ocidente e na América Latina, impulsionadas pelas gerações mais tolerantes e globalizadas. Faz um quarto de século desde que a Dinamarca se tornou o primeiro país a permitir uniões civis, e agora elas são legais em 31 países, enquanto 14 já aprovaram o casamento gay, juntamente com 18 estados dos EUA - dos quais o mais recente foi o reduto mórmon de Utah, embora as disputas legais continuem.

Uma clara maioria dos americanos apóia o casamento igualitário; uma década atrás, era menos de um terço. Em meio à polêmica, não devemos esquecer que eu me lembro quando quatro quintos dos americanos desaprovavam o casamento inter-racial, que só passou a ser aceito por uma maioria pouco antes da virada do século 21. Uma década depois, os americanos elegeram um presidente negro.

Essas transformações mostram a rapidez com que as sociedades podem mudar suas normas. Pesquisas globais mostram que a antipatia em relação a gays e lésbicas está em rápida queda; apenas uma em cada três pessoas diz que a homossexualidade nunca é aceitável. Há sinais de mudança na Ásia, onde a maioria no Japão e nas Filipinas já aceita a homossexualidade, e o apoio aos direitos dos homossexuais mais que dobrou na Coreia do Sul em seis anos. Mesmo na China e na Índia há evidências de um declínio significativo na hostilidade, que pode ser reforçado na Índia pela reação à recriminalização judicial.

As atitudes mais antediluvianas são encontradas em países mais pobres, com as taxas mais altas de religiosidade. Muitas vezes, trata-se do legado de códigos coloniais corrosivos: metade das leis "anti-sodomia" ainda existentes são relíquias do governo imperial britânico. No entanto, mesmo na África, onde 38 países proíbem a homossexualidade e os temores vêm sendo instigados por grupos evangélicos estrangeiros, existe a África do Sul, que autorizou o casamento homossexual cerca de sete anos antes da Grã-Bretanha.

O caminho rumo à verdadeira igualdade para lésbicas, gays e transgêneros ainda é longo. Ele vai acelerar se o papa seguir sua importante declaração de que ele não pode julgar alguém por ser gay com atitudes concretas. Independentemente disso, esses reveses recentes não deve causar desespero, pois os sinais são de que a humanidade está caminhando na direção certa.

Para complementar, com relação ao papa Francisco e à Igreja Católica estamos preparando uma retrospectiva mais detalhada, que publicaremos em breve. Fique de olho!

Não deixe de conferir também a excelente retrospectiva de 
Gunter Zibell no GGN (aqui), que reproduzimos aqui

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